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Músicos enfrentam pandemia recebendo doações e reinventando o jeito de fazer e ensinar música

No Amazonas, a crise para os artistas dessa área, a maioria na informalidade, foi severa. Mas houve quem aproveitou o momento para usá-la como remédio suave para esses tempos estranhos

Por Ana Célia Ossame

A música, que pode alcançar distâncias inimagináveis, foi uma das atividades mais prejudicadas com a evolução da pandemia do Covid-19 tanto no Brasil quanto no mundo. O fechamento dos clubes, casas de show e restaurantes que recebiam cantores e bandas, encerrou também os contratos, colocando em risco a sobrevivência de milhares de cantores e músicos. Mas houve quem aproveitou o momento para usá-la como remédio suave para esses tempos estranhos.

No Amazonas, a crise para os artistas dessa área, cuja maioria trabalha na informalidade, foi severa, explica o presidente da Academia Amazonense de Música (AAM), Josenor Rocha, 53, ao destacar a importância da campanha “Alimente nossa Arte” destinada a receber doações de cestas básicas a serem distribuídas para como músicos, dançarinos, artistas de teatro, circo e até mesmo venezuelanos, que ficaram sem poder trabalhar.

Josenor, que é cantor de ópera do Coral do Amazonas e ostenta o título de ser o primeiro amazonense a cantar ópera oficialmente, explica que o funcionamento desses locais está voltando aos poucos, por isso ainda há necessidade das doações de alimentos, feitos na Internet por meio de redes sociais.

“Nós não aceitamos dinheiro, preferimos a doação do alimento e durante essa pandemia já conseguimos ajudar mais de 2,5 mil dos 4 mil músicos do nosso Estado”, afirma ele, citando que além do “Alimente Nossa Arte”, existem outros meios de ajuda recebidos. Várias  pessoas e entidades,  além de órgãos como da Prefeitura, Governo do Estado, Cruz Vermelha, empresas como TV Lar e outros se sensibilizaram com a situação dos músicos e fizeram doações.

Demanda

Academia Amazonense de Música implementou a campanha “Alimente nossa Arte”

A Academia Amazonense de Música é uma entidade composta por 24 membros imortais e outros honorários e acabou suprindo a ausência do Sindicato dos Músicos do Amazonas, impedido de atuar por ter uma dívida com o Ministério do Trabalho na ordem de mais de R$ 2 milhões. O sindicato não recebe nem mesmo o imposto por ter dívidas com o fisco municipal. “Os músicos não tinham a quem recorrer e acabamos por preencher essa lacuna”, afirmou o cantor, lamentando a situação do Sindicato dos Músicos num momento como esse da pandemia.

Criada por ele e Pedro Amorim, músico e letrista que já dirigiu o Teatro Amazonas, a Academia tem o objetivo de ser uma escola de música. Já ganhou até a cessão de um prédio da Secretaria de Estado da Cultura (SEC), mas precisa de uma reforma avaliada em mais de R$ 2 milhões.

Para ele, no entanto, este momento é de alimentar o sonho de resgatar o que perdemos com a falta de organização na área da música. “Nossa ideia é transformar academia em museu da música e escola de música para meninos da periferia”, afirma Josenor.

Bandas sem shows

A cantora e jornalista Milena Di Castro, da Banda de Bubuia, especializada no público infanto-juvenil, lembra que tinha nove shows agendados no mês de março e para aquele período já havia fechado contrato com um canal de TV para um programa diário destinado às crianças. “Começaríamos a ganhar no dia 16 de março, mas foi tudo suspenso”, lembra ela, que nem chegou a fechar o contrato.

Milena, que também é assessora parlamentar e nas horas vagas trabalha também com doces gourmet, toca há 25 anos na noite e, claro, nunca tinha visto uma crise dessa ordem. “Os amigos artistas começaram a passar dificuldade e aí me juntei ao Josenor Rocha e Paulo Marinho, da Academia de Música, iniciando a campanha para arrecadar alimentos”, conta.

A cantora chegou a fazer em abril um Show Solidário quando foram arrecadadas 800 cestas básicas e em março a campanha ganhou o nome de “Alimente Nossa Arte”. De acordo com ela, nesse período todo, foram essas doações que seguraram tanto a Banda de Bubuia, quanto as demais.

Pelos cálculos de Milena, a campanha “Alimente Nossa Arte” já recebeu mais 2 mil cestas básicas que foram distribuídas aos artistas.

Enquanto alguns restaurantes voltaram a abrir as portas e aos poucos começar a contratar, os músicos esperam que o mesmo aconteça aos demais espaços e assim poder trabalhar, ainda que com restrições. Milena, por exemplo, tem um show fechado, mas terá que ir a banda reduzida por questão de segurança, mesmo em espaço aberto. “Esperamos que esse tempo de pandemia passe logo porque nossas necessidades não se resumem a alimentação. Temos contas a pagar”, explica a vocalista da banda.

Remediando com música

Professora de canto Shirley Sol mudou de ares para ensinar canto

Para sobreviver nos tempos de pandemia sem parar de trabalhar, a professora de canto, a manauense Shirley Sol, 33, mudou a forma de dar aula e de entregar conteúdos. “Tive receio por causa dos alunos, já que muitos precisaram economizar.

A estratégia foi migrar para plataformas digitais e assim Shirley continuou dando aulas, ainda que com algumas desistências de alunos. Com formação em canto livre, musicoterapia e psicologia, Shirley, que atua há 16 anos na área na qual também faz produções, já voltou a dar aulas presenciais uma vez por mês, mas continua firme nas aulas por meio de plataformas. 

O destaque feito pela professora vai para um aspecto interessante nesses tempos de medo causados pelo Covid-10. “O canto ajudou a tranquilizar os alunos, principalmente nos períodos mais severos da pandemia”, revelou Shirley, citando que alguns alunos revelaram nem precisar procurar terapia, por encontrar nas aulas o que precisavam para acalmar a mente. Isso, para ela, revela muito do poder transformador do canto e a da música.

Para quem quiser e puder ajudar a campanha da Academia Amazonense de Música pode entrar em contato pelo e-mail: academiaamazonensedemusica@gmail.com  ou pelo telefone 92 99178-8999.

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