CIDADANIA

Campeonato de canoagem revela atletas indígenas com potencial olímpico

Evento é resultado de um ano de treinamento com jovens da comunidade Indígena Três Unidos, no Amazonas.

Em competição interna, somente com atletas da comunidade Indígena Três Unidos, o jovem Tailon Pontes de Araújo, de 16 anos, conquistou o primeiro lugar realizando a prova em 44 segundos, somente cinco segundos a mais que o medalhista olímpico, Isaquias Queiroz. O atleta amazonense ficou em terceiro lugar nas Olimpíadas do Rio de Janeiro 2016. Naquela edição, Isaquias conquistou o terceiro lugar na prova de canoagem na modalidade C1 – 200 metros. Para subir ao pódio, cruzou a linha de chegada em 39 segundos.

Para Marcelo Santos da Luz, coordenador da Confederação Brasileira de Canoagem (CBCa), a competição é a fotografia do resultado do trabalho que começou em novembro de 2019: “Eles já estão no nível de campeonato brasileiro. O resultado de 44 segundos é extraordinário considerando as condições dos campeões mundiais. Eles têm anos de experiência e canoas tecnicamente melhores. Nossos atletas chegaram a este nível em um ano de trabalho. É uma resposta mais rápida pela aptidão que eles têm por serem indígenas e pelo contato com a natureza, que o ambiente amazônico favorece”. 

O projeto, realizado pela Fundação Amazônia Sustentável (FAS) e CBCa,  tem atualmente 27 estudantes das comunidades Três Unidos, Nova Kanã e São Sebastião que fica na Área de Proteção Ambiental do Rio Negro, administrada pela Secretaria de Estado do Meio Ambiente do Amazonas (Sema). Os estudantes treinam de segunda a sábado, das 5h às 9h e 15h às 18h.

Equipe de canoagem. Foto: Bruno Kelly

Na seca, o treino é mais intenso porque eles têm de descer e subir um barranco de aproximadamente 12 metros com a canoa nas costas. Um dos vencedores do dia, Tailor, não tinha pretensão inicial de ser canoista, mas logo viu benefícios: “Eu não queria, mas depois vi que ser atleta poderia trazer vários benefícios, como ser campeão. Meu sonho agora é participar de uma olimpíada. Fiquei muito surpreso com o resultado de hoje. Não esperava, porque eu sou juvenil”.

Além da canoagem indígena, a FAS fortalece a arquearia indígena também já com excelentes resultados. Até 2019, os jovens beneficiários do projeto de arquearia da FAS já haviam conquistado 42 medalhas. Os desafios para a canoagem incluem a captação de recursos para um projeto recém aprovado pela Lei de Incentivo ao Esporte. “O projeto, em parceria com a CBCa, tem o objetivo de valorizar os jovens por meio do esporte. Agora, vamos apresentar esse projeto para empresários do Distrito Industrial, na expectativa de melhorar as condições de treinamento para esses jovens indígenas”, disse Rosa dos Anjos, supervisora da Agenda Indígena da FAS. 

“Com humildade, a gente conquista tudo que se quer” 

Há três anos, a amazonense Taila Vagem de Souza, de 19 anos, deixou a região do Rio Purus, onde nasceu, para ter melhores condições de estudo na área do Rio Negro. “O estudo é muito dificultoso por lá [no Purus], ia demorar muito para eu terminar. Aí eu e minha mãe achamos que aqui eu teria mais chances de terminar o ensino médio e seguir estudando”. “A vida é feita de oportunidades”, justifica a atleta. “A gente não pode deixar as oportunidades escaparem. Veio um monte de opções e eu não gostava de nenhum esporte, mas a canoagem foi amor à primeira vista”. 

Taila é sobrinha de Sebastiana Vagem Diniz, com quem mora atualmente. A tia viu no esporte uma oportunidade para a jovem melhorar de vida. “Quando o projeto começou aqui eu pensei que seria uma boa para ela. As condições da gente não são boas, eu não tenho condições de pagar um estudo, então o esporte é uma grande alternativa. Ela começou, gostou e nunca desistiu. Não é fácil, mas ela segue firme e agora vitoriosa. Conquistou hoje um segundo lugar, não foi o primeiro, mas já é alguma coisa. E eu sempre digo para ela ter humildade. O sucesso de tudo é a humildade, com humildade a gente conquista tudo que se quer”. 

No evento realizado no domingo, Taila recebeu sua primeira medalha, o segundo lugar na categoria K1 feminino, quando a competidora rema sentada no caiaque. Emocionada, a jovem diz que ser uma campeã é o seu sonho. Com a medalha em mãos, diz que a mãe aposta nela, o que justifica a distância entre elas. “Essa medalha é muito gratificante para mim, principalmente para dar orgulho para minha mãe e familiares”.

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