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Artistas do Boi Caprichoso relatam a aflição de um mês de junho sem cores

De acordo com o calendário oficial do bumbá azul e branco, organizado para esta temporada antes da pandemia, o mês de junho seria recheado de eventos até a apoteose na arena do bumbódromo

Hoje, 1º de junho, sem a pandemia da Covid-19, as manchetes dos jornais estampariam a chegada do mês mais aguardado no Norte do Brasil. Seriam 25 dias até a primeira noite do 55° Festival Folclórico de Parintins. A festa irá esperar, as aglomerações foram adiadas, o grito de campeão ecoará em breve, por enquanto, o Povo Caprichoso seguirá em casa, para abreviar os encontros no Boi de Rua, na fila da galera e na arquibancada do Bumbódromo. Sem os trabalhos ativos nos galpões, os artistas de Parintins relatam a angústia de viver sem a arte, sem o ofício de criar o maior espetáculo a céu aberto da Amazônia.

Jeremias Pantoja, artista que atua há 20 anos no festival afirma que todos os dias sente uma aflição por não poder assumir seu papel. “Entrar no galpão hoje, em pleno mês de junho, causa uma enorme tristeza. Nesta data, 80% dos trabalhos já estariam concluídos e o clima seria de festa, de amizade, e de muito aprendizado. Eu cresci aqui dentro, eu respiro esse lugar, sem os trabalhos do galpão é como perder um pouco da minha essência. Tem sido assim esses últimos meses”, declara.

A diretora administrativa do galpão de fantasias, Karla Picanço, lembra que sem o artista, não tem porquê existir as estruturas vazias. “Esse lugar existe por causa deles. Se deparar com o galpão vago provoca uma sensação terrível. O silêncio aqui dentro nos deixa triste, nos faz lembrar do quanto a arte é importante na vida do parintinense. Apesar de sabermos da necessidade do isolamento neste momento, nunca acostumaremos sem a alegria desse lugar”, expõe.

De acordo com o calendário oficial do Boi Caprichoso, organizado para esta temporada antes da pandemia, junho seria um mês recheado de eventos. O Curral Zeca Xibelão seria palco para grandes festas e ensaios técnicos. Além disso, seriam sequências de aglomerações, como o Boi de Rua, feijoada, passagem de som e teste de iluminação no Bumbódromo, as três noites de festival, e a festa da vitória no dia 29/06.

Uma rotina agitada e festiva, como o parintinense se acostumou a viver. O coordenador de manutenção da Marujada de Guerra, João de Oliveira da Silva, o Debraza, se emociona ao lembrar de todo trabalho que foi interrompido. “Hoje seria um dia de alegria, nossa contagem regressiva até o festival, mas ao passar em frente ao Curral e lembrar que os instrumentos estão sozinhos, sem ninguém para tocá-los, dói e nos deixa profundamente triste. Durante 31 anos no Boi Caprichoso, nunca pensei passar por isso, e rezo para que em breve possamos nos reencontrar”, relata.

O diretor coreográfico e conselheiro de arte, Jair Almeida destaca a força do artista para enfrentar o momento delicado. “A arte do parintinense deriva de uma força popular indescritível. Essa força empírica, autodidata fez brotar na Amazônia uma festa gigantesca, que atrai milhares de pessoas todos os anos. É dessa energia que buscamos encarar a dura realidade dessa pandemia, é com essa gente que vamos realizar, no momento certo, mais um grande espetáculo”, explica.

Apesar de todo cenário atípico para um mês tão festivo, o presidente do Boi Caprichoso, Jender Lobato assegura que o foco continua o mesmo e os trabalhos serão realizados cumprindo com todas as recomendações necessárias, no tempo certo e oportuno.

“Duas coisas são certas. Primeiro, tudo isso vai passar. Segundo a nação azul e branca pode confiar que o Caprichoso vem firme, audacioso e revolucionário. E na hora certa, o torcedor que nunca abandona seu boi saberá que valeu a pena esperar um pouco mais para se orgulhar das cores que escolheu amar”, enfatiza.

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