Emergência climática revela a desigualdade histórica, afirma Lula na abertura da COP30
Em Belém, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva destaca que a “transição justa” para economias de baixo carbono exige reduzir assimetrias entre Norte e Sul e dá voz aos povos da Amazônia
Belém (PA) – Na abertura da COP30 – 30ª Conferência das Partes da ONU sobre Mudança Climática, realizada em Belém nesta segunda-feira, 10 de novembro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez um discurso histórico em defesa da justiça climática e social. Ao posicionar a emergência climática como uma crise de desigualdade, Lula destacou que o enfrentamento das mudanças do clima precisa ser acompanhado de políticas que corrijam assimetrias entre países ricos e nações em desenvolvimento.
“A emergência climática é uma crise de desigualdade. Ela expõe e exacerba o que já é inaceitável. Ela aprofunda a lógica perversa que define quem é digno de viver e quem deve morrer. Mudar pela escolha nos dá a chance de um futuro que não é ditado pela tragédia”, declarou o presidente.
O local escolhido para sediar a conferência – a cidade de Belém, coração da Amazônia – reforça o significado político e simbólico da COP30. Pela primeira vez, o principal evento climático das Nações Unidas ocorre em um bioma reconhecido como essencial para o equilíbrio climático global.
Durante seu discurso, Lula citou o xamã yanomami Davi Kopenawa, para lembrar que é na sabedoria da floresta que o mundo pode reencontrar o equilíbrio necessário para agir.
“O xamã yanomami Davi Kopenawa diz que o pensamento na cidade é obscuro e esfumaçado, obstruído pelo ronco dos carros e pelo ruído das máquinas. Espero que a serenidade da floresta inspire em todos nós a clareza de pensamento necessária para ver o que precisa ser feito”, afirmou.
A menção às comunidades indígenas e tradicionais reforçou o tom do discurso, que reconheceu o papel ativo dos povos da floresta na preservação ambiental e no enfrentamento das mudanças climáticas.
Norte e Sul: a desigualdade em foco
Em um dos trechos mais enfáticos, Lula defendeu que a chamada “transição justa” para economias de baixo carbono não pode repetir a lógica histórica que enriqueceu alguns países à custa da vulnerabilidade de outros.
“Uma transição justa precisa contribuir para reduzir as assimetrias entre o Norte e o Sul Global, forjadas sobre séculos de emissões”, disse.
O presidente alertou que o aquecimento global ameaça empurrar milhões de pessoas para a fome e a pobreza, fazendo retroceder conquistas sociais e econômicas. Também lembrou que os impactos da crise climática recaem com mais força sobre mulheres, afrodescendentes, migrantes e populações em situação de vulnerabilidade.
Críticas ao negacionismo e defesa da ação global
Lula voltou a criticar duramente o negacionismo climático e o uso da desinformação como ferramenta política. Em sua fala, reforçou que a COP30 deve marcar uma nova era de compromissos reais e transparência internacional.
“Na era da desinformação, os obscurantistas rejeitam não só as evidências da ciência, mas também os progressos do multilateralismo. É momento de impor uma nova derrota aos negacionistas”, afirmou.
O presidente defendeu ainda que a humanidade está “na direção certa, mas na velocidade errada” e pediu que os países acelerem suas metas de redução de emissões e de transição energética.
Entre as propostas apresentadas, destacou-se a criação de um Conselho Mundial do Clima, vinculado à Assembleia Geral da ONU, para fortalecer a governança global sobre o tema.
Amazônia como protagonista da esperança
Lula reafirmou o papel central dos territórios indígenas e das comunidades tradicionais na mitigação do aquecimento global. Segundo ele, a preservação das florestas é um ato de regulação do carbono e de proteção da vida.
“No Brasil, mais de 13% do território são áreas demarcadas para os povos indígenas. Talvez ainda seja pouco”, observou.
A COP30, sediada no coração da Amazônia, busca justamente valorizar o papel do bioma e de seus povos como agentes da transição climática justa. A realização do evento em Belém é um marco simbólico e político, que coloca a floresta e suas vozes no centro do debate mundial.
Desafios e legado
Apesar do tom esperançoso, Lula reconheceu que o desafio é gigantesco. O país anfitrião da COP30 precisa conciliar crescimento econômico com preservação ambiental, além de garantir que seus compromissos se convertam em políticas públicas duradouras.
O discurso de abertura deixou claro que, para o governo brasileiro, a emergência climática não é apenas uma pauta ambiental, mas uma luta por justiça, igualdade e dignidade humana.
Se conseguir transformar as palavras em ações concretas, a COP30 poderá ser lembrada como um divisor de águas na história das negociações climáticas. Caso contrário, servirá de alerta sobre os limites da retórica em meio à urgência planetária.
Foto: BrunoPeres/Agência Brasil


