Aplicativo amapaense transforma agricultores em agentes de combate à praga da mandioca
Guardião Rural lançado pelo Governo do Amapá e Embrapa Amapá em 2025 usa tecnologia de monitoramento em tempo real para conter a vassoura-de-bruxa e fortalecer a bioeconomia da mandioca na Amazônia.
Um novo aliado digital está ajudando agricultores amapaenses a proteger a principal base alimentar da Amazônia. O aplicativo Guardião Rural, desenvolvido por técnicos do Instituto de Desenvolvimento Rural do Amapá (Rurap) em parceria com a Embrapa Amapá, transforma o agricultor em parte ativa da vigilância contra a vassoura-de-bruxa, praga que ameaça as lavouras de mandioca em todo o estado. Com envio de fotos georreferenciadas e alertas automáticos, a ferramenta permite identificar focos da doença antes que ela destrua plantações inteiras.
A iniciativa chega em um momento decisivo para a agricultura amapaense. Em 2024, o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) declarou emergência fitossanitária no Amapá após detectar o fungo Ceratobasidium theobromae — causador da vassoura-de-bruxa — em lavouras do município de Oiapoque, no extremo norte. A doença pode provocar perdas de até 100% na produção, colocando em risco a renda de centenas de famílias e a segurança alimentar da região.
Tecnologia e resistência no campo amapaense
Lançado oficialmente em outubro de 2025, o Guardião Rural é um exemplo de inovação aplicada à realidade amazônica. O aplicativo gratuito permite que produtores cadastrados enviem imagens das áreas afetadas e recebam retorno técnico em tempo real, reduzindo o tempo de resposta e o deslocamento de equipes de fiscalização.
“O agricultor deixa de ser apenas um informante e passa a ser um protagonista no combate à praga. Ele fotografa, envia e o técnico já sabe onde agir”, explica Andréa Silva, pesquisadora da Embrapa Amapá. O sistema gera também dados estratégicos georreferenciados, que alimentam mapas de incidência e apoiam políticas públicas de prevenção e manejo agrícola.
Produção em alta e novos desafios
A mandioca é símbolo de identidade e sustento no Amapá. Em 2024, a farinha de mandioca foi o produto mais vendido nas feiras de Macapá e Santana, movimentando R$ 6,6 milhões, o que representa quase 40% de todas as vendas de produtos agrícolas. A produção saltou de 587 toneladas em 2023 para 759 toneladas em 2024, segundo a Agência Amapá de Notícias, crescimento de 29,3% em apenas um ano.
Municípios como Itaubal do Piririm vêm batendo recordes, com 90 toneladas por hectare de produtividade — número seis vezes maior que a média nacional, de 15 t/ha. Esses avanços reforçam a relevância econômica da cultura, mas também revelam sua vulnerabilidade: uma praga disseminada pode gerar prejuízos milionários e interromper cadeias produtivas inteiras.
Um app que conecta saberes e territórios
O Guardião Rural é, na prática, um elo entre o conhecimento científico e o saber tradicional. Agricultores podem registrar ocorrências por meio de um sistema simples e gratuito, acessível via celular. As imagens e coordenadas são analisadas por técnicos do Rurap e da Embrapa, que confirmam os casos e enviam orientações personalizadas.
“O aplicativo permite respostas mais rápidas e decisões baseadas em evidências. Cada agricultor passa a ser um sentinela da floresta, colaborando para proteger a mandioca e garantir a soberania alimentar das comunidades”, afirma o engenheiro agrônomo Rafael Coelho, diretor técnico do Rurap.
Além de diagnosticar, o sistema gera relatórios estatísticos e mapas de calor com a incidência da praga, servindo de base para ações preventivas e políticas públicas voltadas à bioeconomia amazônica.
Bioeconomia e soberania alimentar
A mandioca é mais que um alimento: é herança cultural, moeda social e eixo econômico. Em 2024, a agricultura familiar movimentou R$ 145 milhões no Amapá, e a mandiocultura respondeu por uma parcela expressiva desse montante. O governo estadual investiu R$ 2,8 milhões diretamente no setor, beneficiando cerca de 600 famílias produtoras.
O uso do Guardião Rural consolida um novo modelo de produção sustentável, em que a tecnologia apoia o território e o conhecimento local. A mandioca gera farinhas, tucupi, goma, biofilmes e bioplásticos experimentais, tornando-se um vetor da bioeconomia regional — conceito que une conservação e geração de renda.
Desafios e perspectivas
A principal barreira para a expansão do aplicativo ainda é a conectividade rural. Em muitas comunidades, o acesso à internet é precário, o que limita o uso contínuo da ferramenta. Por isso, o governo do Amapá e a Embrapa estudam lançar uma versão offline, que permitirá o envio dos dados assim que o agricultor tiver sinal disponível.
Mesmo com limitações, o Guardião Rural já se destaca como um exemplo de política pública baseada em ciência e participação comunitária. O aplicativo não apenas protege lavouras, mas também fortalece o vínculo entre o Estado e os territórios produtivos — mostrando que a Amazônia pode inovar a partir de dentro, com soluções criadas por quem vive e conhece a floresta.
Da redação, com informações do Rurap