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Empresas querem manter subsídios para segurar passagem de ônibus a R$ 3,80

No dia 25 de outubro deste ano, em solenidade com o prefeito David Almeida pelo aniversário de Manaus, o governador Wilson Lima anunciou que vai conceder R$ 120 milhões em subsídio para o transporte público em 2022

Sinetram (Sindicato das Empresas de Transportes de Passageiros do Amazonas) aposta na manutenção dos subsídios da prefeitura de Manaus e do governo do Amazonas para manter em R$ 3,80 a passagem de ônibus na capital. Sem o aporte de recursos dos contribuintes, a passagem custaria R$ 5,30.

Além dos R$ 3,80, as empresas cobram mais R$ 1,50, que são pagos pelo município. No total, os empresários recebem somente com os subsídios R$ 13 milhões por mês – R$ 156 milhões por ano. O subsídio municipal é pago desde 2017.

Entre julho de 2019 e janeiro de 2020, a prefeitura de Manaus repassou R$ 60 milhões às empresas durante intervenção financeira. No período de dezembro e janeiro foram R$ 22 milhões destinados às empresas para que a passagem permanecesse a R$ 3,80.

Os contratos mudam a cada ano e o valor da passagem é calculado pelo número de passageiros divido por custos de dia útil. Com a pandemia, a taxa de passageiros caiu 33%, de 600 mil para 400 mil pagantes diários, em média.

“Evidentemente que cada vez mais o poder público será chamado a contribuir para manter o sistema estável e viável. Investimentos também podem ser feitos desde que se mantenha esse sistema também estável, os contratos e o equilíbrio econômico financeiro dos contratos viáveis”, disse o assessor jurídico do Sinetram, Fernando Borges.

No governo José Melo, o Sinetram recebia isenção de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) e IPVA (Imposto Sobre Propriedade de Veículo Automotor). Essa isenção foi retirada em 2017, depois que o prefeito Arthur Neto à época autorizou o aumento da tarifa de R$ 3 para R$ 3,30.

No dia 25 de outubro deste ano, em solenidade com o prefeito David Almeida pelo aniversário de Manaus, o governador Wilson Lima anunciou que vai conceder R$ 120 milhões em subsídio para o transporte público em 2022. Questionado de que forma isso deve ocorrer, o governo não explicou. Segundo Fernando Borges, o Sinetram não recebeu nenhuma informação sobre o fato e classificou como “pretensão política”.

“Os sistemas de transporte passam por uma crise sem precedentes. Há necessidade de manter a operação com frota próxima a 100%, ainda que os passageiros tenham caído de 30% a 40% devido à pandemia. Isso tem causado uma situação insustentável que levou várias empresas a pedir recuperação judicial encerrarem as atividades, outros a falirem”, explicou Fernando Borges.

As empresas alegam perda de passageiros com a pandemia do novo coronavírus. A ANTU (Associação Nacional de Transportes Urbanos) cobra investimentos do governo federal. De acordo com a associação, desde janeiro de 2020 foram registrados 333 movimentos grevistas interrompendo a oferta do serviços em 98 cidades. Foram 87.497 demissões.

Fiscalização e equilíbrio

Para o doutor em Engenharia de Transporte Geraldo Alves, a falta de investimentos no transporte público de Manaus levou a cidade a depender de um único modelo que dificulta a vida dos cidadãos. Alves, que é professor de graduação e pós-graduação em Geografia da Ufam (Universiadade Federal do Amazonas), afirma que a cidade está pagando a conta pelos anos em que o setor não foi tratado com prioridade.

“Faltou interesse dos governos estaduais, municipais e até federal para a mobilidade urbana de Manaus. A fatura está chegando agora, aliás estamos pagando essa fatura há muitas décadas. Estamos falando de uma cidade com mais de 2 milhões de habitantes onde o transporte coletivo está estruturado num sistema de ônibus convencional, em que cidades com 600 mil habitantes já tem corredor exclusivo, BRT, e aqui temos dificuldade de implementar um corredor exclusivo por exemplo na Constantino Nery e Torquato [Tapajós]”, explicou Geraldo Alves.

O especialista defende para que os subsídios sejam mantidos, mas precisam ser fiscalizados. O professor analisa que o desafio do gestor público e das empresas de ônibus a partir de agora é equilibrar o sistema.

“Sejamos honestos, se você fosse dono de uma empresa de transporte você ia querer lucrar, ou você vai lucrar ou se essa empresa estiver dando prejuízo você vai falir ou vendê-la. Vai pegar seu dinheiro e investir em especulação financeira. E aí entra um aspecto muito importante: o papel do estado, da prefeitura, de regular”, disse.

O professor orienta que o poder público tenha em mãos relatórios contantes do quanto as empresas estão arrecadando e qual o custo operacional, para avaliar se os subsídios estão sendo capazes de manter os gastos ou se as empresas estão sendo abusivas.

“O que não pode é que essa entrada (o subsídio) seja muito alta porque aí o lucro fica muito grande. Então, o papel do poder público é conceder o serviço e fiscalizar. Se esse custo operacional (para as empresas funcionarem) começar a ficar mais alto do que o que está entrando, você (empresário) vai trabalhar no vermelho ou vai fechar e não interessa para a cidade que esse sistema pare de funcionar”, explica.

Um exemplo desse baixo investimento é o fechamento da empresa Açaí, que em 30 de setembro deste ano iniciou processo de recuperação judicial, após declarar falência. Os rodoviários que antes trabalhavam na empresa foram transferidos para a  Viação São Pedro e agora cobram direitos trabalhistas que não foram pagos, com greves na cidade.

Crise histórica

O direito ao transporte público passou a ser garantido na Constituição Federal somente em 2015. Antes disso, a crise no sistema era grande em Manaus. Alves lembra que isso começou com a chegada de modelos alternativos na cidade.

Táxi, micro-ônibus, kombis, mototáxi e transporte por aplicativo. Esses modelos foram criados de forma desordenada. As empresas perderam receita e os investimentos do poder público não deram conta. À época, os transportes alternativos eram considerados negativos.

prefeitura de Manaus informa que continua a fiscalizar transportes clandestinos. Em outubro, uma operação do IMMU (Instituto Municipal de Mobilidade Urbana) apreendeu dois ônibus que faziam transporte de forma ilegal. A reportagem questionou quantos transportes clandestinos existem na cidade, mas o órgão nao respondeu.

O aumento dos transportes individuais também foi uma das causas para a fuga de passageiros. Dados do Detran (Departamento de Trânsito) mostram que em 2018 eram 364.991 carros cadastrados. Em 2019 isso saltou para 393.388 e em 2020 foi para 406.275. As motos tinham, em 2018, uma frota de 172.009. Em 2019 eram 183.972 e em 2020, 191.381 .

Foto: João Viana/ Semcom

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